quinta-feira, 19 de março de 2009

a história se repete como farsa

em março do ano passado eu também passei noites em claro fazendo um free lance. em março do ano passado eu também senti um alívio absurdo quando o trabalho acabou. em março do ano passado eu também tinha ingressos para um show. em março do ano passado eu também estava lendo um bom livro sobre gastronomia. em março do ano passado eu também estava sobrecarregado de trabalho.

em março do ano passado o free lance pagou mais. em março do ano passado o alívio foi maior. em março do ano passado eu estava muito mais ansioso para o show. em março do ano passado o livro era melhor. em março do ano passado o trabalho fazia algum sentido.

sou quase a mesma pessoa que era em março do ano passado, subtraída toda a esperança.

segunda-feira, 9 de março de 2009

o dilema do onívoro

parece existir efetivamente na evolução uma espécie de compensação entre cérebro grande e estômago grande. o caso do coala, um dos comedores de cardápio mais restrito encontrados na natureza, apresenta um exemplo de estratégia associada ao cérebro pequeno. não há necessidade de muitos circuitos cerebrais para descobrir o que há para jantar quando tudo o que você come ao longo de toda a vida são folhas de eucalipto. na realidade, o cérebro de um coala é tão pequeno que nem chega perto de preencher todo o espaço do crânio. zoólogos especulam que o coala em outras eras comia uma dieta mais variada e que exigia maior esforço mental do que a adotada por ele agora, e que, à medida que foi evoluindo para seu conceito altamente restrito do que considera uma refeição, o cérebro subaproveitado do animal acabou encolhendo. (que tomem nota disso os que se apegam aos modismos culinários.) para o coala, mais importante do que o cérebro é contar com um estômago grande o bastante para decompor todas essas folhas fibrosas. pelo mesmo motivo, o aparelho digestivo de primatas como nós foi se tornando gradualmente mais curto à medida que evoluíamos de modo a comer uma dieta mais variada e de maior qualidade.
para um monófago com um cérebro do tamanho de um dedal, comer pode ser mais simples, mas também é muito mais precário, o que em parte explica por que existe no mundo um número tão maior de ratos e seres humanos do que de coalas. (...)
o preço dessa flexibilidade em termos de dietas é um conjunto de circuitos cerebrais muito mais complexo e metabolicamente dispendioso.

obra-prima sobre a relação entre estômago e cérebro.