domingo, 30 de novembro de 2008

urge viver

- Chamam-me Natureza ou Pandora; sou tua mãe e tua inimiga.
Ao ouvir esta última palavra, recuei um pouco, tomado de susto. A figura soltou uma gargalhada, que produziu em torno de nós o efeito de um tufão; as plantas torceram-se e um longo gemido quebrou a mudez das cousas externas.
- Não te assustes - disse ela -, minha inimizade não mata; é sobretudo pela vida que se afirma. Vives; não quero outro flagelo.
- Vivo? - perguntei eu, enterrando as unhas nas mãos, como para certficar-me da existência.
- Sim, verme, tu vives. Não receies perder esse andrajo que é teu orgulho; provarás ainda, por algumas horas, o pão da dor e o vinho da miséria. Vives: agora mesmo que ensandeceste, vives; e se a tua consciência reouver um instante de sagacidade, tu dirás que queres viver.

(Memórias Póstumas de Brás Cubas)

enquanto isso, transpiro constantemente como se suasse uma febre, bebo o café que eu mesmo preparei ouvindo stones, e me pergunto: a vontade de nada é capaz de transformar um homem para que ele sobreviva apenas das palavras que escreve?

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